No buraco da minhoca
         Maria A.S.Coquemala  
          Itararé-SP            

   Ou porque assim os astros tinham decidido...Ou porque, de repente, precisamos ser maiores  do que nós mesmos...Ou por isto ou por aquilo, o fato é que um dia ela partiu, malgrado o amor  ao marido e aos filhos. E imprevistamente numa nave espacial. Quase à velocidade da luz, no buraco da minhoca. Quem diria? Sempre ocultara de todos tal projeto.  E mergulhou no espaço sideral, cobrindo-se de pó dourado nas caudas dos cometas, chorando e rindo de emoção nos berçários das estrelas. Tropeçara nos meteoros dos caminhos, enfeitara os cabelos com diademas de fótons, tecera um manto faiscante com  raios de luar. Ah, o espetáculo para sempre inesquecível da implosão estelar! O brilho dos quasares! Mas agora voltaria para casa. Viajara tanto, saudade batendo forte, marido na ponta da Via Láctea, no planeta longínquo, tesudo e amado, ah, saudade demais, desejo intenso...Mas dias, meses, anos  se tinham sucedido na Terra, tantos e tantos anos cronologicamente marcados, tempo longo demais de demais para quem espera e pergunta e anseia, um tempo parecendo estático na saudade do marido, jamais conformado, olhos postos no relógio, tique-taque...tique-taque...E retornou ansiosa e o viu, entre perplexa e comovida, curvado e reumático, os raros cabelos brancos, mal se sustendo de pé. Atônita, via os netos mais velhos do que ela mesma, a marca da passagem do tempo em cada canto. Era o preço da viagem maravilhosa no túnel do espaço-tempo? Ah, aquele Einstein, agente da viagem, que peça lhe pregara! E ela lhes parecia familiar, diziam os filhos, quem era? Poderiam ajudar? Ao que respondia,  coincidência a semelhança, tinha vindo de longe, longe demais, soubera da procura por enfermeira, viera pelo emprego. 
     E ficou. Amaria o pobre ancião, compaixão e domínio do desejo, como prescreve o Buda. Um enigma, exceto ao pobre ancião que... E aconteceu naquela  noite perfumada de jasmins, quando gatos namoram nos telhados as gatas douradas de luar e  grilos cricrilam chamando os pares perfeitos... Então, sorrateiro e trôpego,  procurou Einstein, o agente. Sim, queria viajar ao passado, na véspera em que a mulher iniciara a fatídica viagem. Viajar ao passado? Interrogava Einstein, que graça teria? Viver o vivido? Como insistisse, mandou-o de volta, pelo buraco da minhoca. E se viu, jovem, junto à mulher que amaria para sempre, na vida e na morte. Amou-a  como nunca, tirou a arma do bolso, matou-a e se matou.
***
“Ao Walter, meu filho, que teria ficado orgulhoso...Saudade...”
***
Maria A S. Coquemala esta escrevendo um livro de contos centrados nos conflitos humanos e ambientados no espaço-tempo einstiano. Seus autores preferidos são: Guimarães Rosa, Clarice, Graciliano, Dalton Trevisan, Machado de Assis (nos contos), Mário Palmério, Ariano Suassuna, José Lins do Rego, Saramago, Cervantes, Anatole France, Camus, Shakespeare e Millôr Fernandes.
***
Apoio Cultural:  Academus-Cursos de Línguas - Itararé-SP
***

Próximo Autor--->>>